GALO DE OURO, A SELEÇÃO DO POVO
Há quem considere que o futebol tenha adquirido um novo patamar de qualidade após a revolução das gerações vanguardistas dos anos sessenta e setenta. Esse novo, dinâmico e vistoso futebol, transformaria para sempre nossa maneira de enxergar as organizações dos corpos dentro das quatro linhas. Diversas seleções e times foram montados ao longo dos anos trazendo diversas novas modalidades rítimicas e organizacionais de futebol. Para nós, atleticanos, existe uma convenção de que o nosso time dos anos 80 fora, sem dúvida, o escrete que praticara nosso mais sofisticado futebol. Há também quem defenda que o esquadrão que se desenhou nos anos 10 do século XI seria o maior Galo de todos os tempos, por conta de seus resultados dentro de campo, contando com as façanhas da Copa Libertadores da América de 2013, Recopa Sulamericana e Copa do Brasil de 2014. Todavia, aproveito a reflexão para dizer que, na verdade, dadas estruturas temporais, o nossa geração de maior potência foi o das décadas de quarenta e cinquenta. Sua escalação sobrevive ao longo das décadas na memória do torcedor; até os atleticanos que nasceram muito depois sabem: aquele era mais que um time, mas uma constelação.
Na verdade, o futebol atleticano atingiu seu auge entre os anos quarenta e cinquenta. Sim, meus caros amigos, em meados dos anos quarenta e cinquenta foram formados os mais respeitados e completos esquadrões da história do futebol mundial, aqui mesmo nas Minas Gerais. Esquadrões esses formados apenas de jogadores de nível de seleção e, mais que isso, de jogadores verdadeiramente atleticanos, apaixonados pelo clube e sua torcida - não é atoa que essa geração dos anos 40 e 50, diferente das outras, permaneceu por quase toda carreira no mesmo clube. Como mesmo disse Zé do Monte: "meu futebol é só do Atlético", repetindo a oração de Mário de Castro. E foi também, essa geração, a responsável por gerar parte da identidade do Galo e da Massa.
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Galo dos anos 50, com Lucas, Ubaldo, Haroldo, Zé do Monte, Afonso e Sinval |
Na verdade, o futebol atleticano atingiu seu auge entre os anos quarenta e cinquenta. Sim, meus caros amigos, em meados dos anos quarenta e cinquenta foram formados os mais respeitados e completos esquadrões da história do futebol mundial, aqui mesmo nas Minas Gerais. Esquadrões esses formados apenas de jogadores de nível de seleção e, mais que isso, de jogadores verdadeiramente atleticanos, apaixonados pelo clube e sua torcida - não é atoa que essa geração dos anos 40 e 50, diferente das outras, permaneceu por quase toda carreira no mesmo clube. Como mesmo disse Zé do Monte: "meu futebol é só do Atlético", repetindo a oração de Mário de Castro. E foi também, essa geração, a responsável por gerar parte da identidade do Galo e da Massa.
Zé do Monte é um dos grandes exemplos de que essa geração moldou o Atlético. Tanto o grito de "Galo!", quanto o mascote desenhado por Mangabeira só foram possíveis porque desde os anos 40 o Atlético era chamado de Galo Carijó, e isso se dava por, além de, obviamente, ser um animal de penas pretas e brancas e por ser um animal comum, regional que representa uma idéia de vigor, mas sobretudo porque Zé do Monte, ao cultivar o costume de entrar carregando um grande e imponente galo no gramado, fora o grande responsável por cativar essa relação de identidade simbólica que se tornaria a marca de um povo. Zé do Monte, capitão, ainda incorporava o animal assumindo um estilo de jogo raçudo, imponente, com refinada classe. Não é atoa que o atleticano cobra dos seus jogadores que deem "raça" pelo time. Estamos acostumados com isso, porque essa é nossa essência, está no nosso hino, foi assim que nos formamos e aprendemos a ver e amar o futebol.
Sobre carreira, permanência e identidade com o clube, Zé do Monte disputou 320 jogos (dos quais venceu 206), em uma década inteira doada ao Galo (1946-1956). Monte foi um craque de dimensões planetárias. Quando a bola corria, era um leão. Nos clássicos de maior rivalidade, era comum seus rivais buscarem a agressividade para tirar Monte de campo. Ele costumava sangrar, levar pontos no intervalo dos jogos e voltar com a cabeça enfaixada. Jogava ainda melhor assim. Em dez anos como titular, foi oito vezes campeão daquilo que disputou.
Já Olavo Leite Bastos, o eterno Kafunga, jogou por vinte anos pelo Carijó da Massa (1930-1950). Mesmo dada altíssima concorrência, Kafunga é, por unanimidade, o maior goleiro da história do Atlético. Participou de toda estruturação do clube a medida que o futebol foi se modernizando. Kafunga era um goleiro destemido. Voava nos pés do atacante adversário e fazia qualquer barbaridade para evitar um gol. Senhor absoluto da posição ao longo de duas décadas, defendeu a meta atleticana em quase seiscentas partidas. Kafunga era obcecado por vitória. Para ele, cada treino era um jogo. E o jogo, a defesa da própria vida.
Murilo e Ramos formam aquela que é considerada mais perfeita dupla de zaga que já vestiu a camisa alvinegra - a maior zaga da história do Atlético perdurou e se entrosou por bom tempo - Ramos permaneceu por nove anos no Atlético, em um tempo onde a carreira dos jogadores era curtíssima (1941-1950). "Ramos era um beque poderoso", comenta Ricardo Galuppo, "cuidava de seu pedaço de área com zelo e precisão". Murilo Silva jogou por ainda mais tempo, chegando a doze anos no total (1944-1956). Enquanto defendeu as cores do Galo, Murilo esteve degraus acima dos outros grandes zagueiros do planeta. Murilo foi sem dúvida o mais eficiente zagueiro da história do futebol. Foi um dos poucos a terem conquistado o troféu Belfort Duarte, concedido a quem jogasse mais de dez anos sem ser expulso de campo. Um de seus adversários clássicos foi Petrônio, atacante do América entre 1946 e 1954, rapaz que cultivava um sonho impossível: fazer um gol no Atlético. Com Murilo em campo, Petrônio nunca fizera gol no Galo. No último encontro dos dois jogadores o americano saira de campo aos prantos - eram lágrimas de raiva - sem haver recebido uma única falta sequer, não conseguira se mexer em campo. Murilo simplesmente não deixava.
Mexicano disputou 116 jogos com o manto alvinegro, entre 1946 e 1948, sendo bicampeão naqueles anos; apesar da curta passagem, ele é considerado pelos historiadores do atleticanismo como um dos maiores laterais-direito que vestira nosso manto em toda história do Atlético.
Carlyle, por exemplo, foi o jogador dessa geração que menos durou com a camisa do Atlético. Chegou a Lourdes em 1945, aos dezenove anos, e foi para o Rio de Janeiro em 1948. Por mais rápida que tenha sido sua passagem, Carlyle não foi figura menos importante, aliás, a passagem de Carlyle fora marcante e meteórica, ele foi por exemplo, o primeiro jogador alvinegro a jogar pela seleção brasileira (porque Mário de Castro havia recusado e Guará se machucado). De comportamento forte e mente brilhante, Carlyle foi o primeiro a fazer o tipo "rebelde" do futebol das Minas Gerais.
Lucas Miranda defendeu as cores do Atlético por uma década, entre 1944 e 1954. Lucas foi um dos maiores xodós da torcida durante sua época. Era conhecido como o "Artilheiro do Apagar das Luzes", por seus gols salvadores aos quase-finais de partidas. É o quinto maior artilheiro da história do Atlético. Fez parte do ataque dos "Capeões do Gelo".
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Lucas Miranda, o "artilheiro do apagar das luzes", quinto maior goleador da história do Galo |
Haroldo. Haroldo Lopes da Costa é sem dúvidas o maior lateral esquerdo da história do Clube Atlético Mineiro. Honrou a lateral esquerda alvinegra por uma década, entre 1950 e 1960, representando o Galo em alguns dos principais confrontos da história. Conta com 7 títulos mineiros além de ter sido o representante da nossa lateral canhota na vitoriosa campanha pelo continete europeu.
Afonso. Apesar da fama do entrosamento da dupla Murilo e Ramos, Afonso tem um lugar especial na defesa atleticana dos anos 40 e 50. O zagueiro é um dos mais longevos na história alvinegra. Vestiu a camisa do Galo por 14 anos, entre 1945 e 1958, conseguindo 9 títulos mineiros além de ser peça fundamental da zaga que excursionou pela Europa em 50.
Ubaldo fez 274 jogos e marcou 135 gols com a camisa Alvinegra. Além disso, venceu 6 títulos mineiros e é um dos principais jogadores na história do clube. Representou nosso ataque por mais de uma década, entre 1950 e 1961.
"Quando Ubaldo começou a jogar na equipe titular do Atlético, no início dos anos de 1950, o time ressentia-se da ausência de um grande atacante. Depois que o Atlético perdeu Guará, no célebre acidente com Caieira, iniciou-se uma série de experiências â procura de um substituto à altura do grande ídolo.
Outro ponto importante ao se tratar do assunto de relevância de gerações, das competições existentes em sua época, o esquadrão dessas décadas se consagrou em todas as competições que disputou. É preciso ressaltar que das competições que o Atlético tinha pra disputar até os anos 50, sempre conseguia levantar troféus. Essas gerações dos anos 40 e 50 venceram tudo o que puderam. É tranquilo afirmar que o Galo dos anos 50, por onde viajou, conseguiu mostrar seu lugar de protagonismo no futebol nacional e nos amistosos internacionais.
Aí surgiu Ubaldo, um jogador sem uma técnica mais apurada, e olhado com desconfiança pela Imprensa, que o tachava de "estranho e esquisito". Sua maneira de jogar era diferente: velocidade e entusiasmo como características básicas, aliadas a uma determinação de perseguir a jogada até o fim, sem nunca desistir. Tentar o gol nas condições mais adversas, e, sobretudo, acreditar nas bolas impossíveis. Essa última característica faria dele depois um ídolo da torcida, quando marcava gols decisivos, chamadas de "espíritas" - não se sabia como, mas mesmo em jogadas complicadas e difíceis, a bola tocada por ele acabava no fundo das redes adversárias."
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Ubaldo foi diversas vezes carregado nos braços da Massa por seus gols espíritas |
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O escrete alvinegro que sagrou-se pentacampeão em 1956. |
Outro ponto importante ao se tratar do assunto de relevância de gerações, das competições existentes em sua época, o esquadrão dessas décadas se consagrou em todas as competições que disputou. É preciso ressaltar que das competições que o Atlético tinha pra disputar até os anos 50, sempre conseguia levantar troféus. Essas gerações dos anos 40 e 50 venceram tudo o que puderam. É tranquilo afirmar que o Galo dos anos 50, por onde viajou, conseguiu mostrar seu lugar de protagonismo no futebol nacional e nos amistosos internacionais.
"No final dos anos 30, época em que a precariedade dos transportes transformava a viagem entre Belo Horizonte e São Paulo numa odisséia, a Federação Brasileira de Futebol reuniu num campeonato clubes de quatro estados, torneio vencido pelo alvinegro de Guará e cia, o consagrado Campeão dos Campeões Nacionais de 1937. Depois disso, voltou o retrocesso: os cartolas voltaram a confinar os clubes nos limites de seus territórios. Portanto não haviam muitas opções de torneios a níveis nacionais ou continentais. Ao Atlético, nas décadas de 40 e 50, restou apenas a velha rotina: ganhar títulos estaduais nas costas da velha freguesia e se aventurar pelo mundo por excursões de amistosos. Com isso, o clube tomara para si sua mais nobre missão: honrar o nome de Minas no cenário esportivo mundial. Mais que isso, recuperar o prestígio do futebol brasileiro - enxovalhado pelo vexame diante do Uruguai, na final da Copa do Mundo. O Atlético - primeiro clube brasileiro a excursionar pela Europa depois da implantação do profissionalismo no futebol - não preciso comentar que o auge do futebol brasileiro, a nível de clubes, até hoje, é a nossa excursão vitoriosa pela Europa em 1950."
Kafunga, Carlyle, Murilo Silva, Ramos, Zé do Monte, Lucas Miranda, Ubaldo, Nívio Gabrich, Tião, Afonso, Alvinho, Carango, Lêro, Haroldo, Paulo Valentim, Vavá... É impossível falar do Atlético daqueles tempos sem cometer omissões terríveis. Mão de Onça, Sinval, outros dois dos maiores goleiros alvinegros. Mexicano, por exemplo, foi um dos atletas mais completos de seu tempo. Tomazinho, Gastão, craques de futebol refinadíssimo. Amorim, que além de muito bom de bola, era genro do saudoso Nicolino Lauria, o Nicola, titular do ataque magistral ao lado de Rezende e Guará e que permanecera no clube por exatos treze anos... A lista dos craques durante essas décadas é quilométrica. Além dos craques dentro dos gramados o clube fora comandado por grandes gênios do pensamento futebolístico. O técnico uruguaio Ricardo Diez, e treinador Yustrich, foram também dois importantes personagens. Essa constelação de craques e apaixonados pelo Atlético fez dessas gerações as verdadeiras décadas de ouro do futebol de Minas Gerais. Hoje, dadas as novas fórmulas de administrar-se o futebol, é praticamente impossível que um clube do futebol brasileiro consiga fabricar tantos craques em uma única geração, e mais que isso, que consiga mantê-los, por mais de dez anos, vitoriosos, honrando sempre o mesmo escudo e as mesmas cores.
Referências
Kafunga, Carlyle, Murilo Silva, Ramos, Zé do Monte, Lucas Miranda, Ubaldo, Nívio Gabrich, Tião, Afonso, Alvinho, Carango, Lêro, Haroldo, Paulo Valentim, Vavá... É impossível falar do Atlético daqueles tempos sem cometer omissões terríveis. Mão de Onça, Sinval, outros dois dos maiores goleiros alvinegros. Mexicano, por exemplo, foi um dos atletas mais completos de seu tempo. Tomazinho, Gastão, craques de futebol refinadíssimo. Amorim, que além de muito bom de bola, era genro do saudoso Nicolino Lauria, o Nicola, titular do ataque magistral ao lado de Rezende e Guará e que permanecera no clube por exatos treze anos... A lista dos craques durante essas décadas é quilométrica. Além dos craques dentro dos gramados o clube fora comandado por grandes gênios do pensamento futebolístico. O técnico uruguaio Ricardo Diez, e treinador Yustrich, foram também dois importantes personagens. Essa constelação de craques e apaixonados pelo Atlético fez dessas gerações as verdadeiras décadas de ouro do futebol de Minas Gerais. Hoje, dadas as novas fórmulas de administrar-se o futebol, é praticamente impossível que um clube do futebol brasileiro consiga fabricar tantos craques em uma única geração, e mais que isso, que consiga mantê-los, por mais de dez anos, vitoriosos, honrando sempre o mesmo escudo e as mesmas cores.
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Ricardo Diez conversa com Márcio no início dos anos 50 |
Referências
- GALUPPO, Ricardo. Raça e Amor - A Saga do Clube Atlético Mineiro Vista da Arquibancada. BDA, 2003. Coleção Camisa 13. 173 p. ISBN 8572342818